terça-feira, março 28, 2006

Copas De Uma Infância


120 milhões em ação, pra frente Brasil do meu coração!
Todos juntos, vamos, pra frente Brasil, salve a seleção!

Pois é... Eu berrava isso como se fosse questão de vida ou morte, como se realmente a existência de minha pátria dependesse da voz de cada cidadão, da união de todos para apoiar aqueles guerreiros que defendiam, com bola, chuteira e uniforme, a honra nacional em canchas européias. Era algo maior que tudo, que todos. Era vital e era lindo.

Eu me lembro, junho de 1982, posando para fotos tiradas por meu pai, com a camisa canarinho da seleção brasileira - aquela que ainda tinha a Taça Jules Rimet no escudo em vez do tradicional "CBF" dentro da cruz - e o peito explodindo de orgulho por ter na pele a mesma camisa que usavam Zico, Sócrates, Falcão, Júnior, Mozer, Leandro, Toninho Cerezzo e outros craques. Naquele mês daquele ano, eram motivo de honra as decorações de rua, aquelas bandeirinhas e fitinhas verdes e amarelas atravessando os asfalto a uns quatro metros de altura. O Village, em São Conrado, onde eu morava na época, entrava de corpo e alma no espírito da Copa do Mundo da Espanha de 1982 com pinturas nas calçadas, cornetas ensurdecedoras e bandeiras brasileiras pendentes das janelas.

Eu me lembro da virada de 2 x 1 em cima da velha União Soviética (aquelas camisas rubras com o imponente, quase assustador, CCCP em branco são inesquecíveis!), do baile de 4 x 1 sobre a Nova Zelândia, com direito a golaço de Zico e dos 3 x 1 sapecados na Argentina de Maradona. E me lembro, ainda como se fosse ontem, o dia 5 de Julho de 1982, indo de São Conrado à casa de minha avó em Copacabana e escutando no rádio o nome de Paolo Rossi sendo gritado pela terceira vez - até então, Brasil e Itália empatavam em 2 x 2. Não me pergunte a razão de minha mãe me arrancar de casa em plenas quartas-de-final de Copa do Mundo! Só sei que cheguei lá para assistir os últimos seis ou sete minutos de jogo e simplesmente não entender o placar final. Que sofrimento para um moleque de seis anos...

Em 1986, já com dez, as memórias são ainda mais vivas. O golaço de Josimar (quem se lembra?) contra a Irlanda do Norte, a goleada de 4 x 1 sobre a Polônia e aquele jogo maldito contra a maldita França do maldito Michel Platini. Até aquele dia, a São Paulo que minha família havia adotado como lar se comportava como o Village no Rio, decorações, bandeiras, fogos, cornetas, orgulho. E então veio aquela cruelíssima disputa de penaltis vencida pela França, com bola batendo na trave, na cabeça do goleiro Carlos e entrando no gol. Para um moleque de dez anos, dessa vez a paixão pela seleção canarinho se esmoreceu em sofrimento acompanhado de compreensão. Também não foi fácil.

Passou-se o tempo.

De 1990 pra cá, entre um ou outro fiasco e o pentacampeonato mundial, os anos de 1994 e 2002 me deixaram embriagado e sem voz, orgulhoso ao voltar com mais uma estrela para minha casa nos EUA em 1994 (não que aquele bando de gringos soubesse a significado de um título mundial de futebol, seja este conquistado na terra de Tio Sam ou não), feliz ao desfazer aquela péssima impressão contra a fatídica França em 1998 e em destravar o grito de "É PENTA!" que engasgara quatro anos antes. Aquele menino que sonhou e chorou a década de 80 de sua seleção nacional (ah meu amigo, pelo menos meu Mengão me encheu de glórias!) tinha tudo para transbordar de alegria com as duas vezes em que a taça de campeão mundial foi erguida por mãos tupiniquins.

Mas quer saber? Não foi assim. A catarse não veio como esperada. A magia das Copas do Mundo se foi. O jogo já não era mais o mesmo. Aliás, há muito o jogo não é mais jogo, é negócio. Os 120 agora são 180 e os seis e os dez agora são quase trinta. Mesmo que o país ainda se pinte de verde e amarelo, mesmo que explodam gritos e fogos com os gols de Ronaldo e cia, mesmo com passeatas e trios-elétricos em comemoração, mesmo com minha própria alegria diante de um possível hexacampeonato, a sensação é que extinguiu-se o ritual, desfez-se a obrigação patriota, morreu a "brincadeira". Eu cresci e o futebol também.

O que me resta? Me resta torcer para que um dia eu possa ter um filho. Me resta torcer para que ele possa ser apaixonado como eu fui. Me resta torcer para que ele tenha a sorte de comemorar o título mundial que faltou à minha infância. Me resta torcer... como torci quando criança.

Um comentário:

Renata Rollin disse...

A-DO-REI! Um dos seus melhores!! E olha que não ligo pra futebol... Viu? Quando a gente coloca o coração as palavras fluem... Parabéns! Beijocas