terça-feira, maio 02, 2006

Pó Estelar


Sentei na minha cadeira de praia, que levei para a fazenda no campo, e reclinei o encosto até seu ponto mais horizontal. O iPod, programado em shuffle, dava a largada com Jim Morrison, do The Doors, cantando a fantástica "Waiting For The Sun", embora isso fosse precisamente a última coisa que eu desejava naquele momento. Isto porque, diante dos meus olhos e suas pupilas inteiramente dilatadas, apresentava-se em meio ao breu da noite um céu absurdamente lindo, um cobertor de cor negra pontilhado por o que mais pareciam ser diamantes azuis, brancos, amarelos e laranjas.

Estendia-se diante de mim um quadro de uma beleza intraduzível, de uma magnitude indefinível, de um valor incalculável - um banquete para a imaginação, um carrossel de estrelas.

Ah, mas essa beleza, que volta e meia se torna quase sufocante para mim, não basta.

Me orgulho muito em ser um dos poucos a tentar compreender as implicações da simples existência delas. A imensidão que me separa delas poderia muito bem me desestimular. Muitos diriam que há uma certa inutilidade em destrinchar as entranhas de algo tão distante, tão fora de alcance, tão insignificante para os residentes desta pequena bolinha azul. É mesmo???

Carl Sagan, um dos meus ídolos, diga-se de passagem, colocou essa questão na devida perspectiva para mim quando escreveu "Cosmos": As estrelas, os planetas, todos os corpos celestes são compostos pelos elementos químicos imutáveis já conhecidos pelo homem - carbono, hidrogênio, oxigênio, hélio, etc... Se as células de nossos organismos são também compostas por estes elementos químicos, e se nossa existência, a vida, é o fruto da interação destes elementos, então meus caros amigos, revela-se que somos feitos de pó estelar. Literalmente.

Imagine só! Existe a sólida possibilidade de que um, muitos, todos os átomos de seu corpo tenham um dia sido combustível de uma estrela já morta; uma estrela igual a qualquer uma que vemos noite após noite.

E agora, mudou a perspectiva?

Digamos então que não nos preocuparemos com questões existenciais. Vamos brincar um pouco com a imaginação. Vamos entortar a capacidade da mente humana em entender números astronômicos (sim, piadinha intencional).

Quer ter uma idéia do tamanho de uma estrela? Bom, porque não começarmos aqui na nossa vizinhança?

O sol, esta bola de fogo gigantesca que nos ilumina, nos aquece e nos dá a vida, é uma estrela que, com seu diâmetro de 1,4 milhões de kilômetros, é considerada como sendo de tamanho médio. Sim, médio! Não acredita? E se eu te dissesse que a há uma estrela chamada Epsilon Aurigae que é apenas 1.278 vezes maior que o sol? Não visualizou, correto? Então tente digerir esta informação da seguinte forma: Se colocada no lugar do nosso sol, a superfície de Epsilon Aurigae estaria situada além da órbita de (pasmen!) SATURNO! Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno seriam engolidos!

Tamanho não te impressiona? Talvez então distância...

Quer ter uma idéia do quão longe fica um quasar? Ah, antes que me esqueça, quasares são os núcleos ativos de galáxias contendo buracos negros super massivos (algo não muito diferente da foto acima) e são os objetos mais distantes da Terra. Pois bem, recentemente descobriram um desses troços a 13 bilhões de anos-luz da Terra! Ok, talvez isso mereça também uma explicação: 1 ano luz equivale à distância percorrida pela luz em um ano - ou seja, a 300.000 km por segundo, isso significa (prepare-se) 9.460.536.207.068 trilhões de quilômetros!! Agora multiplique:

9.460.536.207.068 x 13.000.000.000.000 =

Captou? Sentiu o drama? Assimilou o tamanho do número depois do "="? Pois é, nem eu. Ah, mas antes de te deixar salivando com este pequeno fato, deixe-me adicionar mais um: O tal quasar é um tanto quanto brilhante também. 10 trilhões de vezes mais brilhante que o sol, pra ser exato...

Acho que deu pra perceber minha empolgação com este assunto, não? Pois então acredite: A cada vez que me deito sob um céu estrelado como este que descrevi acima, essas são algumas das coisas que me passam pela cabeça. Não, não sou louco. Apenas sei que o mero fato de possuir a capacidade de apreciar algo tão colossal e ao mesmo tempo tão belo é o que há de mais emocionante na vida.

E diante de tanta beleza, diante de tanta grandeza, só posso mesmo concordar com Carl Sagan em sua genialidade:

Sou pó. Sou pó estelar.

Um comentário:

Renata Rollin disse...

Oba! Aula de astronomia!! Olha isso me lembra aquela conversa sobre a Adail... Penso muito isso mesmo, só não tinha essa nomenclatura: se viemos desse tal pó estelar voltamos a ele depois, pois em essência somos parte do cosmos antes, durante e depois. Pensando assim é muito mais fácil aceitar a Lei da Vida... Estamos em toda parte, pulsando, vibrando e distribuindo energia sempre!